No dia 20 de novembro de 2006, o TRE-BA – Tribunal Regional Eleitoral da Bahia – votou pela cassação do prefeito de Vitória da Conquista, José Raimundo Fontes (PT). Ele foi julgado sob a acusação de abuso de poder político e econômico durante a campanha eleitoral municipal de 2004.
O autor da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) foi o candidato derrotado nas eleições para prefeito, o ex-deputado federal Coriolano Sales. A decisão se deu por quatro votos a dois. Dos quatros votos favoráveis à cassação, três deles foram a favor da convocação de novas eleições municipais e um pela diplomação do segundo colocado, os outros dois votos foram pela não cassação do mandato.
José Raimundo Fontes é um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) em Vitória da Conquista. Em 1982 foi candidato a vereador. Candidatou-se a vice-prefeito nos anos de 1988 e 1992. De
Coriolano Sales foi deputado estadual na Bahia entre os anos de 1991 e 1995 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). Desde então foi eleito deputado federal por três mandatos consecutivos. Os dois primeiros pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) e o último pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Porém, em 2003, filiou-se ao Partido da Frente Liberal (PFL), pelo qual concorreu à prefeitura de Vitória da Conquista, em 2004. Sales foi um dos deputados citados na CPI das Sanguessugas, que investiga o uso indevido de verbas públicas destinadas à compra de ambulâncias. Ele renunciou ao mandato de Deputado Federal em 15 de agosto de 2006, evitando a cassação dos direitos políticos, depois de ser acusado de usar o dinheiro para a compra de máquinas para impressão de material de campanha durante as eleições municipais de 2004. Após a renúncia, Sales pediu afastamento do PFL, antes do fim do processo interno no qual se discutia sua expulsão do partido.
O Período Eleitoral
“Após as eleições de 2004 o segundo colocado Coriolano Sales e seu vice Raul Ferraz ingressaram com três ações de impugnação de mandato eletivo em face (contra) do prefeito e seu vice, cada uma com objetos diferentes e algumas representações que ainda não foram julgadas”, declarou o advogado da acusação Alessandro Brito dos Santos. Segundo ele, a AIME que foi julgada, uma das principais, engloba algumas questões que estão sendo ventiladas nos outros processos a título de representação.
O procurador do Município e também atuando como um dos advogados do prefeito no caso, Francis Medeiros, disse que: “Passadas às eleições, com a vitória de José Raimundo, eles entraram na justiça com qualquer tipo de ação para poder desconstituir o resultado das eleições”. Percebe-se que, a partir da quantidade de ações durante a campanha, houve uma verdadeira batalha judicial. A coligação Uma Conquista Melhor, de Sales, impetrou mais de cem processos contra a coligação Frente Conquista Popular, de Fontes, tirando em torno de 20 minutos do programa eleitoral do PT, ao passo que a estrutura jurídica de José Raimundo entrou com no máximo trinta processos arrancando cerca de duas horas do programa do adversário, como relatou Medeiros.
As Causas
O mérito da questão julgado pelo TRE foi o abuso de poder político e econômico realizado, na oportunidade, pelo então candidato e prefeito José Raimundo Fontes durante a campanha eleitoral de 2004. Dentro dessa AIME havia mais de 40 denuncias que foram quase todas consideradas improcedentes pelo Tribunal, restando apenas as que versavam sobre a Rio-Bahia e sobre Centro Municipal de Reabilitação Física (Cemerf).
A Lei Eleitoral veta ao Governo Federal o repasse de fundos para qualquer ente federativo – Estados e Municípios – no período pré-eleitoral - 90 dias anterior as eleições. Quando isso ocorre o princípio constitucional da igualdade, que proporciona aos candidatos as mesmas condições de concorrência, fica abalado e perde-se a noção de justiça que deve ser inerente a uma eleição. A tese da acusação de que as obras da Avenida da Integração (Rio-Bahia) foram iniciadas neste período de proibição foi acatada pelo TRE-BA.
No entanto, a Lei ressalva que havendo uma obrigação pré-existente ou as obras terem sido efetivamente iniciadas poderá existir o repasse das verbas e foi nessa possibilidade que se agarrou a defesa ao tentar convencer o TRE da inocência do prefeito José Raimundo. Alegaram, com provas documentais, que as obras já tinham sido efetivamente iniciadas entendendo que providências iniciais já tinham sido tomadas, a exemplo de locação de equipamentos, analise topográfica e o próprio projeto da obra.
O ponto relacionado ao Cemerf é revestido de uma delicada complexidade. É um ponto que não estava incluso na acusação inicial e nem houve menção ao caso nos pareceres anteriores do Ministério Público. Foi introduzido após uma análise final do procurador eleitoral e que, sem tempo hábil, não foi possível uma defesa mais coesa. A falha indicada pelo procurador eleitoral foi o fato da então secretária de obras do município, Márcia Pinheiro, ter assinado uma ordem de serviço para o CEMEF no dia 28 de junho contendo o número do convenio com a União que só viria a ser assinado em 1º de julho de 2004, três dias depois. Mas o procurador ignorou que o número de convênio é gerado desde a aprovação do plano de trabalho que ocorreu em fevereiro de 2004, ele chegou a afirmar que houve uma falsificação do documento mesmo sem a instauração do incidente de falsidade, mecanismo para apuração de autenticidade de documentos. Estes fatos assinalam um atrito excessivo a princípios basilares do direito como a ampla defesa e o devido processo legal. Autos do processo
O Processo
O ingresso da Aime em questão se deu logo após a diplomação. Em primeira instância a situação já era conturbada, o juiz que instruiu o processo foi Washington Luiz, porém a regra é que o responsável pela diplomação seja o competente para julgar um pedido de cassação, então o processo foi remetido ao juiz Clarindo Lacerda que, nessa primeira instancia, julgou improcedente o pedido, mas a anomalia já havia sido configurada: o juiz que instruiu foi um e quem decidiu foi outro, uma nulidade processual já que juiz incompetente, ou seja, que não é responsável por resolver determinada questão, não pode proferir atos decisórios e ao instruir o processo isso ocorreu. “Essa nulidade não foi acolhida pelo TRE que validou os atos do juiz considerado incompetente. Isso pode gerar uma novidade no TSE – Tribunal Superior Eleitoral”, analisou o advogado e professor do curso de Direito da Fainor (Faculdade Independente do Nordeste, Gutemberg Macedo.
Sem o sucesso esperado no primeiro grau Coriolano Sales recorreu ao TRE
O revisor do processo, Pompeu de Sousa também acolheu a alegação de repasse ilegal de verbas federais e condenou José Raimundo à cassação, porém divergiu da relatora no sentido que não votou pela diplomação do segundo candidato e sim por novas eleições a serem realizadas em até 40 dias após a publicação da sentença, considerando o Art. 224 do Código Eleitoral que determina esse procedimento para casos em que há mais de 50% dos votos válidos para alguns candidatos, outros dois juizes (Antônio Cavalcanti e Cynthia Resende) acompanharam o voto do revisor sem pedir vista ao processo que soma quase 4000 laudas, o que pode ser feito. Mas considerando a situação em discussão que envolve a cadeira do executivo de umas das cidades mais importantes da Bahia é realmente angustiante que juizes simplesmente acompanhem o voto de um colega, verdadeiramente votando sem ler, sem tomar pleno conhecimento da causa.
O professor Gutemberg relata que, “o quinto julgador, Eliezé Bisbo, pediu vistas aos autos e votou pela não cassação do prefeito. O último julgador Pedro de Azevedo, depois de 45 dias com o processo também entendeu que não houve infração à legislação eleitoral e proferiu seu voto contra a cassação”. O TRE é formado por sete juizes, mas o presidente do tribunal só vota em casos de empate.
A decisão só veio a ser publicada, e assim gerando seus efeitos, no dia 29 de novembro. Mas o afastamento efetivo de José Raimundo só acontecerá quando chegar o ofício do TRE ao Juízo Eleitoral determinando a posse do presidente da Câmara Municipal. Assim assumirá o vereador Alexandre Pereira (PT) que atualmente ocupa o cargo já que, a presidente licenciada Lucia Rocha (PFL) está afastada do cargo sob votação de uma Comissão Especial de Inquérito que investiga irregularidades administrativas em sua gestão.
Os Recursos
É certo que as partes vão recorrer de imediato à essa decisão e é grande o leque das possibilidades. Cabe, por exemplo, um embargo no próprio TRE que exigiria a análise mais apurada do caso pelos juizes que não pediram vistas ao processo. O mais provável é que ambas as partes recorram ao TSE. Coriolano Sales em busca da sua diplomação e José Raimundo por sua permanência no cargo. De imediato se tem a certeza de que a defesa requererá o efeito suspensivo ao processo, na prática é o pedido para que o prefeito continue no cargo e não ocorra novas eleições até que o TSE profira sua decisão sobre o mérito da causa, que evitaria maiores problemas. Seria um situação caótica termos realizado novas eleições e o TSE decidi a favor de uma das partes. A decisão sobre o recurso em si demanda alguns meses mas , normalmente, uma liminar solicitando efeito suspensivo é julgada em alguns dias.
Já temos a sentença publicada, poucos dias teremos os recursos e rapidamente uma decisão que vai manter ou tirar o prefeito até que seja dado o juízo final pelo TSE, por considerar remota a chance de este caso subir ao STF. O quadro que agora se aponta é de muitas possibilidades, mas de poucas incertezas como se insiste em anunciar.
4 comentários:
para avisar que o palavrasafins voltou à ativa.
=D
Caro Társis,
Foi você mesmo quem escreveu esse "Traçado da cassação" do prefeito José Raimundo? Está muito bom. Você continua acompanhando a AIME que está sendo apreciada pelos ministros do TSE? Aguardo suas respostas e parabéns pelo belíssimo trabalho.
Um abraço,
José Lopes - jornalista
José,
Em primeiro lugar deixo meu muitíssimo obrigado pelas palavras.
Estou respondendo aqui por você não ter deixando alguma forma de contado, espero que leia.
Eu sou o autor do texto. Ele foi produzido para ser publicado no Jornal Laboratório do curso de jornalismo da UESB, no qual sou discente.
Como o texto final, que saiu no jornal, sofreu alterações por ter mais caracteres do que havia sido destinado pra ele além das novidades que ocorriam a todo tempo (não é fácil manter uma matéria quente em jornal laboratório) , resolvi publicar em meu blog a versão original.
Tenho acompanhado sim os últimos acontecimentos porém de forma menos aprofundada, apenas espectador mas se você estiver fazendo algum trabalho sobre o tema posso colaborar se for necessário.
Estamos às ordens.
Abraço.
parabéns pelo texto
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